quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O tempo, sempre o tempo...

Todos sabemos que o mundo gira, que tudo passa, que o tempo corre esbaforido lá pró fim e mesmo assim queremos que as coisas não mudem. Que parem no tempo exactamente como gostamos e nos lembramos delas.
É aquela sensação de calmia, de silêncio, com que a natureza ás vezes nos presenteia, que nos engana.
Parece mesmo que é possível.
Mas nunca é.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

A minha casa côr de rosa

Ontem, sem aviso prévio, ou seja sem estar preparada, entrei na minha antiga casa. Choque! Primeiro, eu, a bater à “minha” porta! Demoraram a abrir, estavam no jardim, lá atrás, onde não se ouve a campainha, e eu ouvia-os a falar, rir, pareciam-me intrusos, ali tão á-vontade, como se aquilo fosse deles. Depois de um telefonema lá veio ela abrir a porta. Muito simpática, convidou-nos a entrar. Os meus filhos entraram de rompante, numa ânsia de ver, eu a medo, sem querer mostrar e ao mesmo tempo a fazer de conta que aquilo era normal, que não me fazia impressão. Mas estava a sentir tudo, a lembrar-me de tudo! À medida que ía entrando, o jardim, as escadas do alpendre, o corredor, o escritório, a sala de jantar...Foram 10 anos.
As primeiras visitas, quando ela ainda era uma casa abandonada. O amor à primeira vista quando a escolhemos, as visitas semanais durante um ano enquanto a púnhamos de novo bonita, nova. As flores que plantámos, os meus filhos que cresceram ali. Naqueles minutos, breves, à pressa, a fazer conversa de circunstância, tudo me veio à cabeça, como um filme. Lembrei-me de chegar da maternidade com a minha filha, vi os primeiros passos dos meus filhos no corredor, ouvi os seus choros de bebé, lembrei-me do que sentia em cada situação. Estávamos na sala e a minha filha pediu-me em segredo para ver o seu quarto, ela ouviu e insistiu para subirmos. Que impressão! Da janela lá de cima vimos o resto da família no jardim lá de trás. A minha filha encostou a testa ao vidro e temi que chorasse. “Ela é muito sentimentalona” disse eu a disfarçar. “Faz-lhe impressão, é?” …”Pois, disse eu, se até a mim faz”…Ela, amorosa, disse-lhe que podia voltar sempre que quisesse, brincar com os filhos dela.
Apressei a saída, com uma vontade imensa de entrar em todas as divisões, de senti-las outra vez, de lembrar tudo o que vivi em cada uma delas, mas sozinha, sem ter que fazer conversa, sem ter que disfarçar. Bem que eu queria ter vendido a casa a alguém meu amigo, para poder continuar a visitá-la. Mas já não sei se quero, é aquele masoquismo, aquela curiosidade sádica, sabemos que vai doer, mas mesmo assim queremos sentir.
Enfim, já passou…

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Viver

Quero contar, falar, abrir-me. Quero expôr-me e mostrar tudo o que tenho e sou.
Sinto uma vontade louca de viver em expansão total, sair de dentro de mim para o mundo. Viver todas as histórias, as minhas, as reais, as sonhadas, as inventadas
Ser eu, o outro e a outra. Quero abrir-me e entregar-me. Tirar as algemas, despir-me dos medos, limpar-me de mágoas, chorar em público. Quero ser verdadeira, ser mentira, ser igual e ser eu mesma. Sem pudor, de braços abertos, mãos postas, cabelo ao vento. Quero voar, subir ao céu, beber a chuva, agarrar a terra, sujar as mãos e despir-me de tudo. E voltar, e ir e explodir de vida. Sem paciência, sem pressa, sem pensar. Amando. Só.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Carta ao DN de 19/06/1995

Para a familia e amigos de Alcindo Monteiro, cabo verdiano, assassinado no bairro alto, Lisboa, a 10 Junho 1995.

“Venho por este meio apresentar à família e amigos, do Alcindo, os meus mais sinceros sentimentos.
Como portuguesa sinto-me envergonhada, como ser humano sinto-me revoltada com tudo o que aconteceu, e principalmente, extremamente triste.
Quero com esta minha carta, mostrar-vos que mesmo assim, e apesar de tudo, a maioria dos portugueses não são como aquela minoria, marginal, desajustada, complexada, fraca, cobarde, sem referências e sem princípios.
Que para se afirmar, se junta em grupos, se veste de igual e rapa a cabeça; para se sentirem inseridos em qualquer coisa, se denomina ridiculamente de “skins”, movimento “internacional” para estes “nacionalistas”; que para mostrar força, batem e matam pessoas indefesas.
Sem perceber que todo o seu comportamento só demonstra aquilo que realmente são, uns vermes cobardes, autêntico lixo, um projecto fracassado de ser humano.
Quero também expressar a minha admiração por vós, cabo verdianos, Africanos em geral, vindos das ex-colónias portuguesas, que depois de tudo o que passaram lá, vêm para Portugal, honrar-nos ao serem portugueses.
É uma honra e um privilégio poder considerá-los irmãos, cidadãos do mesmo País.
Dão-nos, ao nosso País, o vosso trabalho, a vossa simpatia, a vossa alegria, o vosso calor, a vossa música, a vossa dança, a vossa cultura, e acima de tudo a vossa dignidade.
Obrigada!
E peço desculpa em nome daqueles, e em nome de todos os portugueses, por não sabermos recebê-los como devíamos e como mereciam.
De uma cidadã portuguesa, solidária com a vossa dor. “

domingo, 17 de janeiro de 2010

Coisas da idade

Isto da idade é uma ganda treta.
Vamos lá ver. Uma pessoa parece mais nova do que é, pelo menos é o que dizem e nós, temos que confessar, achamos sempre isso. Raramente uma pessoa se vê ao espelho como é realmente, ou no mínimo como os outros nos vêm, e esses outros também variam entre si…(ganda treta!) .
Um exemplo, falando de pessoas na casa dos 40, um pouco antes e um pouco depois. Vem alguém e pergunta a nossa idade, invariavelmente é gente um pouco mais nova, uns 5 ou 6 anos. Nem os muito mais novos, por pudor, nem os muito mais velhos por desinteresse, perguntam a idade.
Então nós respondemos: “Tenho “tal” . E eles: “Não !!!!! A sério???” e nós “ Sim, é verdade!” E vamos ficando mais animados por dentro… E eles “Não parece nada, eu achava que tinhas… pronto, uns “tal”! E esses “tal” que eles nos dão, são menos uns míseros 4 anos! Para nós nada, para eles muito, mas não tão pouco como sermos da idade deles, que, como disse ao inicio, dista de nós uns 5 ou 6 anos, mas como também já disse, cada um sente-se sempre mais novo.
E a animação passa. A cara que fazem e que espelha o que lhes vai na alma, e nós sabemos bem porque já tivemos aquela idade, há bem pouco tempo. É que eles então olham-nos tipo “coitada, afinal é mais velha, já tem “tal” !!!” Em vez de olhar-nos tipo “ fantástica, não parece nada, é como se não tivesse esta idade, quem me dera estar assim daqui a 5 anos…”
Ao dizermos a nossa verdadeira idade , mesmo quando não parecemos, ficamos rotuladas com aquela idade, passamos imediatamente de “não-sei-que-idade-tem-mas-parece-pouco” para “não-parece-mas-É-velha”.
A idade, que é tempo, é relativo!

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Pedaços III

Aquelas ruas com pedras grandes, altas, gordas
Pequenos mundos, palcos, cenários
Planícies, montes, campanários
Ermidas caiadas de branco, recortadas no fogo do céu do entardecer
Ruas iguais ás outras e a todas
Esquinas escuras onde nos escondíamos
Onde me agarravas e me davas tudo

Já não há nada
Olho e não vejo
O que tenho já não é teu
Eu, já não me sinto em ti.

Pedaços II

Num tempo qualquer fomos amantes
Únicos, marginais dos outros
Tu entravas em mim como eu própria
Sem diferença
Olha para mim!
Vê-me, sente-me!
Tu já não estás,
E o meu corpo treme, frio, abandonado
Tu eras eu

sábado, 9 de janeiro de 2010

Pedaços I

Sinto o meu corpo inerte, estendido, a penumbra sobe, estilhaça-se, os pedaços caem
Cortantes, penetram em mim e rasgo-me
Tu tomas-me, agarras o que tenho e te quero dar
Não te sinto em mim
Traíste o que não te dei